(Folha de sala do filme "Home: O País da Ilusão")
Enquanto habitantes de um país como Portugal, estamos histórica, social e culturalmente extremamente familiarizados com o conceito de emigração. Milhões de portugueses partiram nas últimas décadas, sendo por isso fácil percebermos o que leva alguém a deixar o país natal, e estabelecer-se noutros locais. Enquanto portugueses, povo da saudade, será muito mais difícil entendermos o porquê de nunca mais se regressar. E aqui, deparamos-nos com a protagonista de Home: O País da Ilusão: Lila. Uma mulher de 67 anos que passou a maior parte da sua vida expatriada da sua terra natal, Bogotá. Relata-nos diretamente, através da câmara de filmar, que viveu em diversos países europeus seguindo o companheiro, residindo em Portugal há vários anos, e que não regressa à Colombia há quase 40 anos. Josephine Landertinger Forero, realizadora e filha de Lila, mune-se do documentário não só para desvendar o que motiva e motivou esse não regresso e, não sendo uma questão de resposta fácil ou direta, questionar as decisões que Lila tomou ao longo da sua vida errática.
Num olhar que nos aproxima à obra de Chantal Akerman (Jeanne Dielman, 23 Commerce Quay, 1080 Brussels ou No Home Movie) no registo do quotidiano e na apropriação dos espaços habituais da vida diária, permitindo aos intervenientes uma maior familiaridade e conforto na história que contam, Josephine apropria-se também da rotina diária e doméstica da mãe. Seguindo-a pela casa e pela vizinhança, no trabalho e em momentos de lazer, valoriza esses momentos com Lila para iniciar o diálogo com ela, compreender melhor a sua história e aspirações. O quotidiano e a rotina normalizam os relatos de viagens pela Europa, aventuras em hotéis na Alemanha ou a situação ilegal em Portugal, de onde emerge uma verdadeira identidade solitária, dedicada, e estóica, sendo evidentes os sacrifícios que Lila foi obrigada a fazer, primeiro pelo companheiro e posteriormente pelos filhos. Em vários momentos, as respostas mais elucidativas e claras que dá à filha não derivam do seu discurso, mas do seu olhar e expressão corporal.
O diálogo que se desenvolve entre estas duas mulheres torna-se ocasionalmente tenso, com as questões de Josephine sobre as decisões que a mãe tomou ao longo da vida, e onde nem todos os assuntos estão abertos a discussão ou diálogo. Apesar disso, e da ligação próxima das duas intervenientes, o documentário consegue transcender simples questões familiares para criar uma reflexão sobre memória, saudade e melancolia que abre o filme a todos os que o veem. É fácil estabelecer empatia e pensar nas nossas figuras maternais, nas suas histórias, nas suas lutas e sacrifícios que fizeram. Home: O País da Ilusão é mais do que uma homenagem a esses que se sacrificam, dignifica todos aqueles que sobrevivem diariamente. Sejam os que são obrigados a abandonarem a sua terra natal, para muita vezes nunca mais voltarem; as mulheres que se tornam dependentes dos seus companheiros, eventualmente tornando-se cuidadoras deles na velhice; as mães que anulam os seus sonhos e aspirações em prol dos filhos. Josephine faz-nos refletir sobre o amor incondicional e o sacrifício a que ele nos obriga, em que todos nos conseguimos rever.