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Espaço de Cinema para o Ar Entrar e Circular

por Ricardo Vieira Lisboa / 22 11 2021


Numa sala de cinema, com as portas abertas, o espetador entra e sai a seu preceito: senta-se, permanece de pé, deita-se ou caminha pela divisão. Na tela projetam-se, em contínuo, uma seleção de seis trabalhos do artista paquistanês Basir Mahmood, descrevendo uma década do seu trabalho, entre a videoarte e o cinema. Este é um Espaço de Cinema Para o Ar Entrar e Circular, ou seja, um espaço arejado para o contacto com o outro. 

Ao longo dos últimos dez anos, o trabalho de Mahmood tem vindo a revelar recorrências e obsessões, que se tornam evidentes neste loop de 70 minutos. A primeira delas, o modo como a intervenção da câmara altera o real, impondo a encenação e o desconforto dos gestos. Depois, há o interesse do artista pela banalidade se certas ações quotidianas (descascar uma peça de fruta, vestir um fato, caminhar para trás e para diante, sentar numa cadeira), que a constante repetição eleva a uma dimensão quase iconográfica. Basir trabalha, igualmente, o subtexto político, tanto no choque cultural entre ocidente e oriente, como no papel da farsa na dramaturgia eleitoral ou o papel dominante da masculinidade e a violência de género que lhe está associada. Por fim, outro tropo singular do trabalho do artista paquistanês é a sua relação com a história do cinema do seu país, e as ruínas de Lollywood (como é chamada a indústria de cinema do Paquistão, que nos anos 1970 foi a quarta maior do mundo, e hoje está reduzida a subprodutos televisivos). 

Este é, portanto, um trabalho sobre o limites da perceção da realidade por uma câmara de filmar. E como tal, exploram-se aqui noções de pose e de (auto-)representação, de desconforto e apatia perante um olhar exterior e de como se cristaliza um gesto. Mas sempre através de uma lente semi-opaca que oculta mais do que revela, produzindo imagens e situações misteriosas, cujo segredo só se revela numa imagem de conjunto, isto é, na coerência e unidade da obra de Basir Mahmood.

O artista recebeu o prémio Paulo Cunha e Silva em 2020.

Informações detalhadas dos filmes podem ser encontradas aqui. O acesso a esta sessão é livre.  


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