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A Câmara e os Homens

por Jean Rouch / 24 11 2017


Em 1973, Jean Rouch escreveu A Câmara e os Homens, um texto seminal sobre as complexas relações entre Cinema e Antropologia. Recuperamos aqui as conclusões dessa reflexão, num exercício de antecipação de uma revolução nos modos de produção e de um provável futuro do cinema que não tardaria em chegar. No centenário do nascimento do realizador francês, o Porto/Post/Doc dedica um foco ao seu trabalho, O Cinema-Verdade: 100 anos de Jean Rouch, projetando cinco das suas obras em cópias restauradas.

Estamos agora no final da nossa história sobre o lugar da câmara entre os homens, ontem e hoje. E, por enquanto, a única conclusão que se pode desenhar é que o filme etnográfico ainda não passou da sua fase experimental. Embora os antropólogos tenham essa fabulosa ferramenta à sua disposição, eles ainda não perceberam como utilizá-lo se acordo com as suas necessidades. 

Até agora, não existem “escolas” de filmes etnográficos; existem apenas tendências. Pessoalmente, espero que esta situação marginal se prolongue para que a nossa jovem disciplina possa evitar a esclerose da gola de ferro, ou a burocracia estéril. É bom que existam diferenças entre filmes etnográficos americanos, canadianos, japoneses, brasileiros, australianos, britânicos, holandeses e franceses. Dentro da universalidade de conceitos na abordagem científica, mantemos uma multiplicidade de orientações: se os cine-olhos de todos os países estão prontos para unir, isso não passa simplesmente por ter um ponto de vista. Assim, o filme nas ciências humanas é, em certo sentido, a vanguarda da pesquisa cinematográfica. E se alguém encontrar características semelhantes na diversidade de filmes recentes, como a multiplicação das sequências de planos (pedi a um fabricante de câmaras leves que fizesse uma com capacidade para 1000 metros de película para que eu pudesse filmar durante meia hora), é porque as nossas experiências nos levaram a conclusões semelhantes e, portanto, deu origem a uma nova linguagem cinematográfica. 

E amanhã?... Amanhã será o momento do vídeo a cores totalmente portátil, da edição de vídeo e da repetição instantânea (“feedback instantâneo”). Ou seja, o tempo do sonho comum de Vertov e Flaherty, de um cine-olho-ouvido mecânico e de uma câmara que pode participar tão totalmente que passará automaticamente para as mãos daqueles que, até agora, estiveram apenas em frente à lente. Nesse momento, os antropólogos já não controlarão o monopólio da observação; a cultura dessas pessoas, e eles próprios, serão observados e gravados. E é dessa forma que o filme etnográfico nos ajudará a “compartilhar” a antropologia.

Filmes a exibir:
· La pyramide humaine 
· Les maîtres fous
· Moi, un noir
· Jaguar
· Chronique d'un été


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