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Porto/Post/Doc

16 - 26 Nov 2022

Em 2022 desejamos reencontrar o público nas salas. Depois de as duas últimas edições terem sido assombradas pela pandemia, estamos de volta para concretizar o projeto de fazer um festival de cinema que agite a baixa do Porto. Em 2014, quando começámos, estávamos bastante isolados como programadores de cinema no centro da cidade. Cedo, tivemos como companheiro de aventuras o Cinema Trindade. Agora, temos encontro marcado para dezembro, na abertura do Batalha Centro de Cinema. O público e a cidade ficam a ganhar com a diversidade da oferta entre as salas comerciais e os vários festivais entretanto criados, o que aumenta, naturalmente, a responsabilidade de todos nós, enquanto programadores. No Porto/Post/Doc estamos certos que esta vitalidade vai contribuir para cimentar novos e alargados hábitos de consumo de cinema, promovendo um aumento do público nas salas.

Mas algo mudou na forma como vemos cinema antes e depois da pandemia. Foram dois anos de reclusão que alteraram, para sempre, os nossos hábitos sociais. É fundamental, para todos, focarmo-nos na formação de novos públicos. Um festival de cinema tem de ser, inevitavelmente, popular e lugar de encontro, por isso é para nós fundamental consolidar um vínculo com os mais jovens (que, atraídos por um sem número de propostas audiovisuais meramente lúdicas, necessitam deste tipo de vivência cultural). Só assim será possível continuar a dar sentido ao nosso trabalho e fazer com que o cinema seja o que sempre foi: uma linguagem popular e de fácil acesso, para todos.

Nesta nona edição continuaremos a ter como casa os cinemas da baixa. A abertura acontecerá na grande sala do Coliseu, local onde em 2021 encerramos o festival. Desta feita, esta parceria promove a estreia nacional de um filme que congrega a memória da música popular na figura ímpar de Leonard Cohen. De frente ao maior ecrã da invicta, esperamos que Hallelujah: Leonard Cohen, A Journey, A Song promova o encontro entre várias gerações, enchendo assim uma sala que tem marcado as memórias cinéfilas e musicais da cidade. A programação acontecerá de 17 a 26 de novembro no Cinema Passos Manuel e nas duas salas do Cinema Trindade com paragens diárias obrigatórias no conforto do Maus Hábitos, sede do festival nesta semana intensa. A Casa Comum da Reitoria da Universidade do Porto será também lugar de passagem obrigatória.
Ao longo dos onze dias do PPD, a equipa de programadores do festival apresenta um conjunto de filmes desafiadores, arriscados e prazerosos, cuja seleção resulta de intensos debates entre os membros desta equipa e de uma reflexão consciente de que o cinema continua a ser um território de interação profunda com o mundo. As várias competições do festival, a Internacional, a do Cinema Falado, a do Cinema Novo e do Transmission, congregam entre elas uma grande capacidade de nos reconciliar com as nossas histórias que, de alguma forma, são tornadas visíveis aqui (quer no espírito de descoberta de novos nomes, quer pelo apego aos temas e aos autores). Este é, portanto, o lugar do cinema e dos seus autores, dos artistas originais e fiéis a uma linguagem que nos faz sentir parte de um todo e que reconhece no cinema a força necessária para resistir aos totalitarismos e à manipulação das massas. 

Com o programa Nós a Revolução, com o qual destacamos o cinema húngaro a partir de seis filmes arrebatadores de Márta Mészáros e de Miklós Jancsó, apontamos o foco à história, aos seus mitos e à sua representação. Entre o documentário e a ficção, estes são filmes que nos falam dos perigos de não valorizarmos a memória colectiva que nos visita através do cinema. Um cinema que nos recorda que é preciso primeiro olhar, para sermos capazes de acreditar. Já a retrospetiva dedicada a Sierra Pettengill traz ao festival um olhar contemporâneo sobre a memória, a política e os media. Um cinema que se constrói em torno da urgência de olhar de novo para as imagens do passado (as imagens de arquivo) e assim refletir, de forma consciente, sobre os modos de atuação dos nossos representantes.

O nosso projeto educativo reafirma-se, este ano, primeiro num envolvimento regular com oficinas desenvolvidas nas escolas do Porto e Grande Porto, ao longo de todo o ano letivo; em segundo lugar, sempre com a presença dos alunos nas salas do festival, o serviço educativo traz, ao longo desta semana, várias dezenas de turmas ao cinema, através de sessões pensadas para os mais novos, ao que se acresce o trabalho realizado pelo júri Teenage, a oficina Microcosmos para pais e filhos e a competição de jovens autores do Cinema Novo (onde se afirmam os novos nomes do cinema em português). É aqui que se encontra a única possibilidade de manutenção futura (e de crescimento) de um público mais informado, curioso e que, acima de tudo, acredite no cinema enquanto peça essencial para a sua formação como indivíduos autónomos e culturalmente plurais. 
A programação à volta das questões associadas à saúde mental, a que chamámos “Neurodiversidade”, ocupa um lugar de destaque nesta edição. Enquanto festival coerente que se junta às causas em que acredita, trazemos cinco histórias que trazem para o ecrã a força da representação de pessoas neurodiversas e as várias dimensões que podem adquirir as doenças mentais e as formas de viver com elas (de as ultrapassar ou por elas ser consumido). 

A diversidade de linguagens do cinema que se descobre nesta edição encontra um dos seus mais completos exemplos no programa Europa 61 que se junta, pela primeira vez, à semana do PPD. Também no Cinefiesta e na nova secção Novos Talentos, este ano dedicada à Suíça, acompanhamos esta vontade de ir simultaneamente mais longe e mais perto, trazendo os filmes e os assuntos que, longe da padronização do cinema mais comercial, encontram neste festival uma forma privilegiada e responsável de chegar ao público.
O Industry, secção voltada para a produção nacional e para o desenvolvimento de estruturas regionais de criação e produção de cinema, encontra, nesta semana de confluência de participantes internacionais, o momento adequado para encontros entre profissionais do setor. Este ano dedicado a França e Espanha, este conjunto de atividades contará com programadores, distribuidores e produtores que procuram estabelecer parcerias para o desenvolvimento e promoção de novos projetos.
Para terminar, o nosso projeto mais querido, Working Class Heroes. Este programa, iniciado em 2021, que se traduz num convite anual a cineastas portugueses e internacionais, procura criar as condições para a produção de um filme sobre e a partir das estórias do Porto. Estórias que ficaram perdidas nas memórias e que precisam de ser contadas no cinema, as estórias dos anti-heróis da classe operária que foram afinal os protagonistas dos movimentos culturais e sociais.

Assumimos, em equipa, o nosso amor pelo cinema. É importante, para todos, partilhar convosco esta celebração que será única e memorável. Até já, numa sala de cinema.

Dario Oliveira