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Snakeskin

Snakeskin · Snakeskin

Daniel Hui

2014, SGP, PRT, 105', M12


Carte Blanche Dennis Lim 2014 / Há Filmes na Baixa!

11 Dez 2014 · Passos Manuel · 19H00

07 Abr 2015 · TM Rivoli, Pequeno Auditório · 18H30

07 Abr 2015 · TM Rivoli, Pequeno Auditório · 22H00


Em 2066, um sobrevivente de um culto enigmático narra a história traumática do seu país e dos acontecimentos que levaram à ascensão e queda desse culto, e onde surgem fantasmas de 2014 e de antes como testemunhas. Parte documentário onírico, parte sinfonia citadina, o filme traça a linhagem de opressão inscrita na paisagem e no inconsciente colectivo de Singapura. Folha de Sala Toda a memória do mundo (sobre "Snakeskin") «A noite escura deu-me os olhos da escuridão. E, no entanto, eu uso esses olhos para procurar a luz.» Gu Cheng Uma das utopias do cinema é conseguir captar o real em todas as suas dimensões. Isto é, dar conta de todas as subtis nuances do mundo, imaginar linhas alternativas da história. A forma mais útil de fazer essa procura é promover um caos de imagens e de histórias que possam, num momento ínfimo, captar essa pluralidade. "Snakeskin", documentário de Daniel Hui (segunda longa-metragem do realizador), tenta fazê-lo, tal como faziam os grandes mestres do documentário que pensa: Chris Marker ou Alain Resnais. Não se julgue empresa fácil ou mesmo que não implique uma certa retórica, mas esse puzzle é encantador na forma como faz uma ligação entre as imagens, as memórias e o mundo. Em "Snakeskin", o jogo é colocado quase à partida pela distância temporal: olhando de 2066, vemos o quê? Como dissemos, é um jogo retórico, porque o filme devolve-nos um olhar sobre o mundo contemporâneo e os resquícios das memórias perdidas de anónimos e das suas vidas (colecionadas por Daniel Hui). O dispositivo é um claro enunciador de que se vão contar histórias: vozes off, que raramente sincronizam com a imagem, contam memórias singulares de uma zona geográfica repleta de contradições identitárias. Colocado no centro de Singapura – de onde o realizador é natural – mas fazendo ligações profundas entre identidades próximas – Malásia, China, Japão – e opressões coloniais (o império britânico), o filme transforma a sua escala “pequena” (as histórias comuns), num debate sobre a História. Por isso mesmo, são convocados, ciclicamente, os mitos fundadores dessa cidade-estado. A identidade parece, por isso, ser o centro das atenções de "Snakeskin". O jogo com o título não é inocente: uma pele (máscara) que é reciclada periodicamente. Tal acontece também com a identidade (seja ela pessoal, nacional, sexual, etc.): é instável e totalmente dependente do momento histórico e das suas variáveis. Isso parece sobressair a cada momento que o filme olha, com detalhe, para as suas personagens: elas parecem buscar um fundo histórico aonde construir as suas histórias pessoais, a sua memória essencial. E lutam contra o seu próprio património familiar (evidente na história da filha que rejeita a sua mãe, inventando uma história alternativa). Em todo o caso, "Skaneskin" utiliza, como meio de discussão do mundo, um dispositivo tecnológico que pretende fixar a memória: o cinema. Mas tal como qualquer dispositivo que tenha o mesmo objetivo, o cinema é intrinsecamente frágil: a sua matéria física é degradável e o seu conteúdo narrativo é manipulável. É por isso que o filme se seduz pela metáfora do fogo: tudo queima, tudo arde no devir da história. A película a arder é só mais uma forma de mostrar esse indelével percurso do mundo. Resta, tal como acontece na epígrafe do filme (e deste texto), entrever, por momentos, uma luz que nos ilumine. Daniel Ribas (Porto/Post/Doc)